Todos nós sabemos que, batizados que somos, temos um compromisso com a evangelização. A assembleia do CELAM, realizada na cidade de Aparecida, SP, em 2007, – lembram-se? – , com a presença do Papa Bento XVI, produziu um vigoroso documento, tratando exatamente de nossa missão de evangelizar, missão que nos envolve a todos, bispos, padres, religiosos, leigos e leigas.
Em seu n.º 134, diz: “ Como discípulos e missionários, somos chamados a intensificar nossa resposta de fé e anunciar que Cristo redimiu todos os pecados da humanidade, no aspecto mais paradoxal de seu mistério, a hora da cruz. O grito de Jesus: “Deus meu, Deus meu, por que me abandonaste? “ (Mc.15, 34) não revela a angústia de um desesperado, mas a oração do Filho que oferece a sua vida ao Pai no amor para a salvação de todos.
O texto continua no número seguinte: “ A resposta ao seu chamado exige entrar na dinâmica do Bom Samaritano, que nos dá o imperativo de nos fazer próximos, especialmente de quem sofre, e gerar uma sociedade sem excluídos, seguindo a prática de Jesus que come com publicamos e pecadores, que acolhe os pequenos e as crianças, que cura os leprosos, que perdoa e liberta a mulher pecadora, que fala com a samaritana.”
Mais adiante, o documento nos lembra que assim como Jesus é testemunha do mistério do Pai, assim os discípulos são testemunhas da morte e ressurreição do Senhor até que Ele retorne. Cumprir essa missão não é tarefa opcional, mas parte integrante da identidade cristã, porque é a extensão testemunhal da vocação mesma.
Caros leitores, em um de nossos editoriais, dizíamos que a vocação missionária “Ad Gentes” é algo gestado em nossas origens, faz parte do DNA dos MSC. Assim, esse preâmbulo quer chamar sua atenção para um tema especial desse número de nossa revista.
Trata-se do artigo intitulado Santuário em seu Lar, uma iniciativa apostólica, uma espécie de Escola Missionária, composta de padres, seminaristas e leigos de nossas de nossas paróquias, os quais, devidamente preparados, colocam-se a serviço de outras comunidades que têm à sua frente padres missionários do Sagrado Coração, da Província de São Paulo.
A primeira experiência aconteceu na paróquia da Aparecida, cidade de Bauru, SP, localidade donde, na década de 1910, os nossos padres se espalharam por aquela região, assumindo várias comunidades. Segundo o autor do artigo, o trabalho foi coroado de pleno êxito, o que vocês poderão conferir ao ler a matéria.
Mas esse número de ANAIS tem ainda muita coisa boa. Vale a pena ler e refletir.
A REDAÇÃO
Entende-se por época do Novo Testamento o período que transcorreu entre a morte de Cristo e a morte do último apóstolo, época também chamada era apostólica. Ainda sob o impacto da ligação direta com um apóstolo vivente, a comunidade cristã desse período tinha no culto o seu modelo de identificação. O evento Cristo, assumido por Jesus de Nazaré, foi uma explosão querigmática marcada pelo anúncio do Evangelho da salvação e de curas que indicavam a presença de Deus libertando seu povo e introduzindo o homem na situação metafísica do amor (Agape). Não era um movimento sistemático, mas querigmático. Isso marcou, de certa forma, a estrutura e a liturgia da comunidade apostólica, que foi pouco a pouco definindo o que era de natureza cristã e de natureza judaica. Porém, o culto da era apostólica pode ser definido de forma clara.
Em primeiro lugar, era um culto de profundas raízes judaicas, tanto bíblicas como extra-bíblicas, culto marcado pela história e pela memória. Deus tem presença ativa na história e estabelece com seu povo uma aliança, fundada na recordação do Êxodo. Dessa forma, Israel consegue superar a dimensão naturalista do culto, dando-lhe um significado histórico e construindo o memorial, cuja organização interna segue a tríplice dimensão do tempo: evoca o passado para celebrar o presente e fortalecer a esperança no futuro em torno do “Êxodo definitivo”. Assim o culto de Israel contém um movimento de esperança e uma tensão escatológica voltada para o futuro. A segunda característica do culto na era apostólica é sua originalidade, fundada na distinção da liturgia judaica à medida em que o cristianismo se diferencia do judaísmo. Surge entre os cristãos uma estranha anticultualidade que recusa os paradigmas judaicos e pagãos, evitando termos técnicos como templo, sacerdote, altar e sacrifício.
Na verdade, esse comportamento representa as atitudes de Jesus diante do culto. Embora fosse um homem de oração e de participação no culto de Israel, Jesus também transgride, em favor da salvação, leis cultuais rigorosas, como a lei do sábado e da pureza ritual, além de tornar relativo o significado do Templo. Esse último elemento torna-se credencial para sua pena de morte e motivo de zombaria ao Condenado que morria na cruz (Mc 13,29). O culto que Jesus propôs é um culto em espírito e verdade (Jo 4,20).
Baseados nisso, os cristãos da primeira hora lançam-se com entusiasmo dando um caráter extático à experiência de fé e proclamando com ousadia que Jesus Cristo é o Senhor. Assim dão a fundamentação do novo culto: o agape de Deus revelado em Jesus Cristo, morto e ressuscitado para sempre.
Uma nova categoria de culto surge no horizonte do cristianismo primitivo: o culto de uma vida vivida no Senhor. Ela é pautada pelas ações e pelos dons do Espírito Santo. Não se trata de um culto ritual, mas de um culto espiritual que representa a vida do dia a dia, vivida na koinonia (serviço) do Espírito Santo. É um conceito paulino de relevância e só pode representar a vida vivida no amor. Porém, esse culto só se mantém cm conexão com o culto ritual da liturgia. Assim, o papel da assembleia litúrgica ganha força no cristianismo da era apostólica e o termo ekklesía torna-se técnico para definir a comunidade cristã. É a partir da liturgia que a comunidade cristã ganha o nome de Igreja.
Além da Eucaristia, agora os cristãos assumem o batismo como rito que gera um novo cristão. Evangelização, fé e conversão constituem o trinômio que garante o batismo (cf. At 2,41; 8,12; 18,18). Por meio dele o cristão é implantado na situação metafísica do amor e integrado na Igreja de Cristo, que tem como fundamento o ensino dos apóstolos, a comunhão fraterna, a fração do pão e as orações (At 2,42).
No primeiro momento, os cristãos afastam-se um pouco da Torá judaica para viver o ensino de Jesus (didaché) transmitido pelos apóstolos. Na Liturgia da Palavra seguem o modelo sinagogal. A seguir realizam a koinonia (comunhão fraterna), seja na refeição comum ou na ajuda aos necessitados da comunidade. Em seguida, realizam a fração do pão (eucaristia), que é a ceia do Senhor descrita em 1Cor 11,20.
Reúnem-se em casas particulares no primeiro dia da semana, num estilo bastante simples e doméstico. Experimentavam fortemente o caráter extático da liturgia, pelo qual clamavam maranathá: Vem, Senhor Jesus (Ap 22,20; 1Cor 16,22). As orações representam, sobretudo, o sagrado costume hebraico de cantar os salmos nas horas canônicas. Provavelmente, era uma prática que os cristãos faziam juntamente com os judeus, embora, para os convertidos a Cristo, cada verso tivesse um sabor cristológico.
Fr. Michel dos Santos, MSC é Seminarista Religioso e cursa o 4º. Ano de Teologia na PUC/SP
Nós que prosseguimos, devemos a eles o respeito de irmãos e irmãs. Caminharam conosco por anos, sonhando os mesmos sonhos e sofrendo as mesmas dores do reino, até que para eles e elas ficou difícil continuar a servir a Deus dessa maneira. Não deu mais. Alguns podem ter perdido a fé e a perspectiva, mas a maioria continuou amando a Jesus e à Igreja e servindo ao Senhor. Não perderam a vocação . Só não foi mais possível servir e amar num convento, no celibato ou no ministério . Para eles ficou difícil demais prosseguir naquele caminho de vida . Para não servirem a Deus infelizes e desajustados, procuraram seu ajuste noutro caminho.
Há quem os diminua por isso.
Há quem fale em perda, fuga, infidelidade e fracasso; o que é injusto, porque há fracassados que continuam, mas servindo sem amor e há muitos deles que se tornaram pessoas melhores depois da mudança de vida. Cada caso é um caso!
Nós que ficamos nos conventos, nas paróquias, nas pastorais e achamos que podemos ir até o fim, temos mais é que respeitá-los. Por um tempo conseguiram, cheios de zelo e amor, ajudar o povo de Deus como padres, freiras e irmãos. Foi vocação. Sentiram-se chamados. Houve um momento em que, ou não foi mais possível responder daquele jeito ou sentiram-se chamados a outro caminho. Pediram licença, fizeram tudo nos conformes. Mas, ficar não dava mais. Em nenhum momento quiseram desafiar a Igreja, mas o coração pedia um lar, um amor ou um outro caminho de serviço.
Falo dos maduros. Sofreram e ainda sofrem bastante com suas opções. Tenho vários amigos e amigas, maravilhosos em tudo, que já exerceram o ministério sacerdotal e já viveram como religiosas. Aprendi e ainda aprendo muito com eles. Nunca me achei melhor do que eles só porque continuo. Nem sei se os entendo, porque não passei pelo que eles passaram. Mas de ouvi-los, sei o quanto sofreram e ainda sofrem.
Continuam companheiros. Alguns adorariam poder atuar, mas nossa Igreja ainda não fez esta opção. Enquanto isso, prosseguem com saudade, mas sem mágoa, na mesma direção do mesmo reino . Mudaram de veículo, mas não de destino. Nunca os chamo de ex padres ou ex freiras. Chamo-os de irmãos. É o que são. Um dia nossa igreja saberá aproveitar melhor suas capacidades.
Enquanto isso não acontece, que sejam vistos como servidores de Deus, lá onde agora estão, alguns mais, outros menos felizes, outros infelizes como antes. Julgá-los, nunca ! Essas coisas do coração e da fé não podem ser medidas na base do era e não é mais. A maioria continua viajando na direção do mesmo infinito, amando como antes. Se você nunca viveu perto deles ou delas, não terá uma ideia do quanto lhes dói a palavra ex. Não a use. Eles não a merecem.
Pe. Zezinho, SCJ é músico e escritor. Tem aproximadamente 85 livros publicados e mais de 115 álbuns musicais. www.padrezezinhoscj.com