Mês de agosto e vocação. É difícil não associar o mês ao tema. Desde a nossa mais tenra idade e já iniciados na formação nos encontros de catequese, conhecemos essa dobradinha. A liturgia das missas enfatiza o tema com cartazes, músicas, danças.
As homilias dominicais, mesmo que en passant, tratam do assunto. Nos colégios católicos e na imprensa católica, um artigo, nota ou aviso, suscita sempre a temática.
É bom lembrar que a vocação não deve ser vista como a realização de um projeto pessoal. Não é um planejamento do que queremos para a nossa vida. É antes o encontro da nossa liberdade com o convite de Deus.
A bíblia está repleta desse sublime encontro entre o chamamento de Deus e a resposta acolhedora do ser humano: Abraão, os profetas, discípulos de Jesus… Ser vocacionado é sentir-se escolhido por Deus.
A Revista de Nossa Senhora traz todos os meses uma reflexão sobre vocação. Implícito, o tema está em nossas obras pastorais, apresentadas na coluna “Nossas Obras”.
Nela, uma obra apostólica é apresentada todos os meses. E estas obras, no Brasil ou fora dele, são assumidas por alguém enviado por Deus, em nome de nossa Província, para exercer a sua vocação.
Tenha o prazer de uma boa leitura!
A Redação.
A liturgia da Igreja pressupõe, integra e santifica elementos da criação e da cultura humana conferindo-lhes a dignidade de sinais da graça, da nova criação em Jesus Cristo.
Texto: Pe. Luiz Eduardo Pinheiro Baronto
Uma celebração sacramental é tecida de sinais e de símbolos. Segundo a pedagogia divina da salvação, o significado dos sinais e símbolos deita raízes na obra da criação e na cultura humana, adquire precisão nos eventos da antiga aliança e se revela plenamente na pessoa e na obra de Cristo.
Sinais do mundo dos homens. Na vida humana, sinais e símbolos ocupam um lugar importante. Sendo o homem um ser ao mesmo tempo corporal e espiritual, exprime e percebe as realidades espirituais por meio de sinais e de símbolos materiais. Como ser social, o homem precisa de sinais e de símbolos para comunicar-se com os outros, pela linguagem, por gestos, por ações. Vale o mesmo para sua relação com Deus.
Deus fala ao homem por intermédio da criação visível. O cosmos material apresenta-se à inteligência do homem para que este leia nele os vestígios de seu criador. A luz e a noite, o vento e o fogo, a água e a terra, a árvore e os frutos falam de Deus, simbolizam ao mesmo tempo a grandeza e a proximidade dele.
Enquanto criaturas, essas realidades sensíveis podem tornar-se o lugar de expressão da ação de Deus que santifica os homens, e da ação dos homens que prestam seu culto a Deus. Acontece o mesmo com os sinais e os símbolos da vida social dos homens: lavar e ungir, partir o pão e partilhar o cálice podem exprimir a presença santificante de Deus e a gratidão do homem diante de seu criador.
As grandes religiões da humanidade atestam, muitas vezes de maneira impressionante, este sentido cósmico e simbólico dos ritos religiosos. A liturgia da Igreja pressupõe, integra e santifica elementos da criação e da cultura humana conferindo-lhes a dignidade de sinais da graça, da nova criação em Jesus Cristo.
Sinais da aliança. O povo eleito recebe de Deus sinais e símbolos distintivos que marcam sua vida litúrgica: estes não mais são apenas celebrações de ciclos cósmicos e gestos sociais, mas sinais da aliança, símbolos das grandes obras realizadas por Deus em favor de seu povo. Entre tais sinais litúrgicos da antiga aliança podemos mencionar a circuncisão, a unção e a consagração dos reis e dos sacerdotes, a imposição das mãos, os sacrifícios, e sobretudo a Páscoa. A Igreja vê nesses sinais uma prefiguração dos sacramentos da Nova Aliança.
Sinais assumidos por Cristo. Em sua pregação, o Senhor Jesus serve-se muitas vezes dos sinais da criação para dar a conhecer os mistérios do Reino de Deus. Realiza suas curas ou sublinha sua pregação com sinais materiais ou gestos simbólicos. Dá um sentido novo aos fatos e aos sinais da Antiga Aliança, particularmente ao Êxodo e à Páscoa, por ser ele mesmo o sentido de todos esses sinais.
Sinais sacramentais. Desde Pentecostes, é por meio dos sinais sacramentais de sua Igreja que o Espírito Santo realiza a santificação. Os sacramentos da Igreja não abolem, antes purificam e integram toda a riqueza dos sinais e dos símbolos do cosmos e da vida social. Além disso, realizam os tipos e as figuras da antiga aliança, significam e realizam a salvação operada por Cristo, e prefiguram e antecipam a glória do céu.
PALAVRAS E AÇÕES
Uma celebração sacramental é um encontro dos filhos de Deus com seu Pai, em Cristo e no Espírito Santo, e este encontro se exprime como um diálogo, mediante ações e palavras. Sem dúvida, as ações simbólicas já são em si mesmas uma linguagem, mas é preciso que a Palavra de Deus e a resposta de fé acompanhem e vivifiquem estas ações para que a semente do Reino produza seu fruto na terra fértil. As ações litúrgicas significam o que a Palavra de Deus exprime: a iniciativa gratuita de Deus e ao mesmo tempo a resposta de fé de seu povo.
A liturgia da palavra é parte integrante das celebrações sacramentais. Para alimentar a fé dos fiéis, os sinais da Palavra de Deus precisam ser valorizados: o livro da palavra (lecionário ou evangeliário), sua veneração (procissão, incenso, luz), o lugar de onde é anunciado (ambão), sua leitura audível e inteligível, a homilia do ministro que prolonga sua proclamação, as respostas da assembléia (aclamações, salmos de meditação, ladainhas, profissão de fé…).
Inseparáveis enquanto sinais e ensinamento, a palavra e a ação litúrgicas são indissociáveis também enquanto realizam o que significam. O Espírito Santo não somente dá a compreensão da Palavra de Deus suscitando a fé; pelos sacramentos ele realiza também as “maravilhas” de Deus anunciadas pela palavra: torna presente e comunica a obra do Pai realizada pelo Filho bem-amado.
CANTO E MÚSICA
“A tradição musical da Igreja universal constitui um tesouro de valor inestimável que se destaca entre as demais expressões de arte, principalmente porque o canto sacro, ligado às palavras, é parte necessária ou integrante da liturgia solene.” A composição e o canto dos salmos inspirados, com freqüência acompanhados por instrumentos musicais, já aparecem intimamente ligados às celebrações litúrgicas da antiga aliança. A Igreja continua e desenvolve esta tradição: Recital “uns com os outros salmos, hinos e cânticos espirituais, cantando e louvando ao Senhor em vosso coração” (Ef. 5,19) . “Quem canta reza duas vezes.”
O canto e a música desempenham sua função de sinais de maneira tanto mais significativa por “estarem intimamente ligados à ação litúrgica”, segundo três critérios principais: a beleza expressiva da oração, a participação unânime da assembléia nos momentos previstos e o caráter solene da celebração. Participam assim da finalidade das palavras e das ações litúrgicas: a glória de Deus e a santificação dos fiéis:
Quanto chorei ouvindo vossos hinos, vossos cânticos, os acentos suaves que ecoavam em vossa Igreja! Que emoção me causavam! Fluíam em meu ouvido, destilando a verdade em meu coração. Um grande elã de piedade me elevava, e as lágrimas corriam-me pela face, mas me faziam bem.
A harmonia dos sinais (canto, música, palavras e ações) é aqui mais expressiva e fecunda por exprimir-se na riqueza cultural própria do povo de Deus que celebra? Por isso, o “canto religioso popular deve ser inteligentemente incentivado a fim de que as vozes dos fiéis possam ressoar nos pios e sagrados exercícios e nas próprias ações litúrgicas, de acordo com as normas e prescrições das rubricas. Todavia, os textos destinados ao canto sacro hão de ser conformes à doutrina católica, sendo até tirados de preferência das Sagradas Escrituras.”
Pe. Luiz Eduardo Pinheiro Baronto
Fé não é questão de pedir muita coisa a Deus e menos ainda de falar no nome do Senhor da boca para fora. Fé Cristã é vivência do Evangelho.
Texto: Pe. Paulo Roberto Gomes, mSC
É muito comum escutarmos pessoas dizerem: “meu filho, meu marido têm muita fé, apesar de não ir à igreja”. Geralmente, fazem esta observação pelo fato de que o filho, o marido ou outra pessoa, de vez em quando, recorra a Deus ou a algum santo. Outros dizem: “eu tenho fé, porque aceito tudo o que a Bíblia diz e a Igreja ensina sem nunca questionar ou duvidar”. Seria isto fé? O que falar dos fanatismos, intolerâncias, moralismos, alienações e todo tipo de infantilismo na relação com Deus?
O verbo crer vem do latim – credere/cordare – significa dar o coração a Deus. Na Bíblia, o coração é a pessoa por inteiro em sua consciência, decisões e afetos. Crer, então, significa entregar-se totalmente a Deus de tal forma que minha maneira de agir, minhas decisões, minhas relações sejam pautadas pelos valores do evangelho. Crer significa confiar totalmente em Deus, buscar sua vontade, colocar sua única esperança no Senhor. Fé é fidelidade, perseverança, firmeza e convicção.
Nem sempre a pessoa que aceita tudo o que a Bíblia diz ou a Igreja ensina é uma pessoa de fé. Nem sempre aquele que nunca duvida é um crente. Podemos aceitar tudo, nada questionar e nunca mudar nada em nossa vida. Podemos nutrir exageros em matéria de religião como o fanatismo, a intolerância religiosa e o moralismo por causa de nossas inseguranças e da visão estreita de Deus e de sua Palavra. A pessoa de fé se conhece pelo seu comportamento.
A forma de tratar as pessoas com respeito e dignidade; a valorização de sua comunidade (Igreja); a forma como se preocupa com os pobres, excluídos e sofredores; seu jeito de viver e amar. A fé verdadeira se concretiza no amor.
Jesus foi muito claro ao dizer que “nem todo aquele que diz: Senhor, Senhor, entrará no Reino dos Céus, mas sim aquele que faz a vontade do Pai que está nos céus” (Mt 7,21). Fé não é questão de pedir muita coisa a Deus e menos ainda de falar no nome do Senhor da boca para fora. Fé Cristã é vivência do Evangelho.
Fé é entrega e abandono nas mãos de Deus, perseverança, fidelidade, convicção de vida. Significa colocar Deus como o absoluto de tal forma que Ele esteja presente, norteando nossos relacionamentos, decisões, nossa consciência, nossa existência. Fé Cristã é um comportamento de acordo com o Evangelho, com a proposta de Cristo. É abertura a Deus e ao outro, respeitando seu jeito diferente de ser, pensar, falar e professar outro credo diferente do meu.
Crer é um ato pessoal. Significa que eu tomo uma decisão em minha vida por Deus e pelo seu projeto de ser humano e de nova sociedade. Essa decisão, esse ato de entrega e comprometimento, ninguém pode fazer no meu lugar. Ninguém pode crer por mim.
Crer é um ato comunitário. A Comunidade Cristã é o lugar onde partilho, alimento, fortaleço minha fé. É o lugar onde me deixo ser questionado, desafiado para manter em contínua avaliação a minha vida e me converter. É o lugar do cultivo da minha existência como crente através da oração diária, da meditação da Palavra de Deus, da participação ativa na Celebração da Eucaristia, do estudo bíblico, da confissão de meus pecados e do serviço que presto na evangelização de meus irmãos e irmãs.
Crer tem dimensões sociais. Não se vive como cristão dentro de quatro paredes, mas no mundo, dando sua contribuição para a defesa do meio ambiente, dos direitos humanos, para que haja ética na política, para a superação dos preconceitos, injustiças e exclusões. Quem entra num processo de se tornar um ser humano novo, renovado em seu coração pela Graça de Deus colabora para que também surja um mundo novo “sem ódio, sem rancor e sem cobiça”.
Por isso, nas orações da Igreja fazemos a conclusão dizendo “amém”. Essa resposta pode ser traduzida por “estou firme”, “confirmo”, “estou convicto do que foi dito”. Da próxima vez que você disser “eu creio”, “eu tenho fé” ou “amém”, tente perceber se tudo isso brota do mais profundo do seu ser como convicção. Tente avaliar sua perseverança, fidelidade a Deus e ao seu Evangelho. Procure perceber se há um comportamento condizente com o que você diz. Caso contrário, serão apenas palavras vazias ditas diante de Deus. Nada mais do que uma grande mentira.
Pe. Paulo Roberto Gomes, mSC é Pároco da Paróquia São Paulo, em Muriaé, MG.