O salmista gritou por socorro, ao ver a epidemia de infidelidade que assolava Israel. Nos salmos 12,36,52 os israelitas cantavam em protesto contra os sem palavra e os que iam embora de Deus, traindo a Ele e ao seu povo. Não se podia mais confiar na palavra de ninguém, porque a maioria quase absoluta buscava o próprio bem estar. Israel vivia sob a égide do “salve-se quem puder”, ou do “leve vantagem você também”. Era o tempo dos espertos que topavam qualquer coisa para se ficar rico e ocupar postos de honra.
Das leituras dos profetas percebe-se que só Deus é fiel; o ser humano precisa aprender a ser fiel e sofre sempre a tentação de faltar à palavra dada quando, pesados os prós e os contras, levará vantagem ao abandonar um compromisso.
A fidelidade era vista como virtude de um santo. Deus é fiel. Quem consegue ser fiel, está mais perto do projeto de Deus. Quem fugia da dificuldade e escolhia seu conforto e sua vantagem pessoal era mal visto.
Isso não dá, hoje, a nenhum cristão o direito de sair por aí denunciando quem lhe pareceu infiel. Houve santos que deixaram alguma situação para buscar mais dificuldade, porque o serviço a Deus e aos pobres o exigia. Tereza de Calcutá mudou de grupo religioso, não por mais conforto, mas por busca de compromisso ainda maior. Como Tereza, muitos outros santos mudaram para levar mais cruzes.
Mas houve e há os que partem para levar vantagem numa outra igreja ou num outro jeito de crer. Os salmistas e os profetas eram duros contra quem adaptava a Palavra de Deus aos seus interesses. Paulo, particularmente alerta contra um tipo de pregador e de fiel que busca a filosofia sofista: ir em busca de quem o diz de maneira agradável e dizer de maneira agradável para levar vantagem sobre a Palavra.(2 Tm 4,1-5) Adaptar a Palavra aos nossos objetivos era e permanece magna tentação para todo fiel e todo pregador que se pretenda crente.
Uma coisa é interpretar a Palavra de Deus para os nossos dias e outra, bem outra, é adaptá-la aos nossos interesses. Ligue o rádio e a televisão e esmiúce os testemunhos de conversão de uma para outra igreja, analise as promessas e garantias de sucesso, oferecidas pelos pregadores e as certezas gritadas ao microfone. Depois leia sua Bíblia e pergunte a si mesmo o que é crer em Deus. Buscar o mais fácil, o mais garantido e perseguir o sucesso político, religioso e financeiro pode ser tudo, menos fidelidade.
Deus é capacitador, mas não está escrito em nenhum lugar da Bíblia que ele é facilitador. Onde se promete uma vida sem dor e sem cruz é sinal de que, ali, o marketing da fé superou de longe o caminhar da fé.
Pe. Zezinho, SCJ, é músico e escritor. Tem aproximadamente 85 livros publicados e mais de 115 álbuns musicais.
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O capítulo 20 do evangelho joanino descreve a cena: 1. O sepulcro, cuja protagonista é Maria Madalena. Diante do sepulcro vazio, ela vai buscar ajuda. Pedro e o discípulo amado vão ao sepulcro juntos. O discípulo amado crê mesmo sem ver. 2. O encontro: Maria Madalena encontra-se com o Senhor. 3. Aparição aos dez discípulos escondidos e assustados. Jesus devolve-lhes a alegria e presenteia-os com o Espírito Santo, a paz messiânica e a missão de perdoar pecados. 4. Aparição aos onze: Tomé, que se afastou da comunidade, fraqueja na fé. Voltando à comunidade pode fazer a experiência do Cristo Vivo e Ressuscitado.
O final do quarto Evangelho (Jo 20, 30-31) é a conclusão desta obra catequética que declara seus objetivos: para que creiamos – que Jesus é o Messias – o Filho de Deus – e que, crendo, tenhamos vida – em seu nome.
O capítulo 21 é um acréscimo depois da conclusão. Redigido por outro membro da comunidade joanina, ele apresenta o bom pescador (21, 1-14), que depois de uma noite cansativa de trabalho inútil escuta a voz de um jovem e pesca uma quantidade imensa de peixes. O simbolismo do texto aponta para a presença do ressuscitado, que manda pescar (evangelizar), e para Eucaristia, como comunhão fraterna. Em Jo 21, 15-23, Jesus faz Pedro passar de pescador a pastor do rebanho.
Quanto ao discípulo amado, nenhuma vez aparece o seu nome. Dele é dito que Jesus o amava (13,23-25; 19,26-27; 20,2-10; 21,2-8.20-24) como um amigo especial. Ele “enxerga” melhor e por primeiro; é o mais achegado a Jesus; é o mais fiel indo até o fim; chega primeiro ao túmulo, mas deixa Pedro passar na frente; até ajuda Pedro a reconhecer o Senhor (21,7).
CONCLUSÃO:
Todo evangelho é uma obra catequética nascida dentro de uma comunidade de fé. Ele não se preocupa com uma biografia de Jesus ou simplesmente narrar histórias, mas quer ajudar a comunidade a crer em Jesus. Usando os sete sinais e os discursos, colocados na boca de Cristo, podemos experimentá-lo em plenitude na nossa vida. Da mesma forma que crer é um processo, o quarto evangelho nos propõe um itinerário espiritual para seguirmos Jesus, abraçando seu projeto de Vida para todos.
Pe. Paulo Roberto Gomes, MSC é teólogo e pároco da Comunidade São Gonçalo, em São Gonçalo, RJ.
“Padre, não sei se o Sr. se lembra de mim, mas faz algum tempo, eu lhe escrevi perguntando sobre a preocupação de um amigo evangélico. Mais uma vez venho pedir-lhe uma explicação, também sobre Nossa Senhora. É o seguinte: eu sempre soube que no caso da assunção de Maria aos céus, a Igreja deixou em aberto a questão de sua morte, mas por ocasião de sua festa, em agosto, ouvi numa TV católica, um padre afirmar que Maria morreu. O que o Sr. me diz?” Adriano Marques da Silva – por e-mail.
Caro Adriano, sim, lembro-me de uma consulta sobre um amigo seu que se tornou evangélico e que, em sua nova comunidade, sentia falta do culto a Nossa Senhora. Quanto ao seu questionamento de hoje, tanto você como o padre da TV tem razão. Recordemos um pouco do histórico desse culto desde os primórdios, quando surgem, no oriente, entre os séculos IV e VI, as primeiras narrativas sobre o passamento da Virgem, a partir de escritos apócrifos, onde se fala do Transitus (passagem) ou Dormitio (dormição) da Mãe de Deus. Algumas igrejas celebravam a morte de Maria, outras a sua ressurreição, seja só da alma, seja da alma e do corpo. A Igreja copta, por exemplo, celebrava a morte e a ressurreição de Maria, sucessivamente, nos dias 6 e 9 de agosto. Também na Igreja do ocidente havia divergências sobre o destino final da Virgem.
Assim, embora não houvesse bases bíblicas para sustentar essa verdade, usava-se o princípio da “Lex orandi, Lex credendi”, isto é, um consenso baseado na fé unânime e universal dos cristãos católicos. O fato eclesial era mais que suficiente para uma definição dogmática. O enunciado da definição dogmática, segundo a qual, “A Imaculada Mãe de Deus, a Sempre Virgem Maria, terminado o curso de sua vida terrena, foi assunta à glória celestial em alma e corpo”, evita falar de morte, não define como foi seu fim nem o modo de sua morte. Alguns chegam a dizer que Maria foi arrebatada diretamente à glória do Cristo, sem ter morrido no sentido estrito do termo, segundo nos diz Paulo, em 1 Tes. 4, 17, a exemplo dos justos da última geração.
Caro Adriano, como você pode perceber, o tema é bastante polêmico, a Igreja deixa em aberto a questão da morte de Maria, de modo que tanto você como o padre da TV tem razão, mas hoje, a tendência dos teólogos, em geral, é pela sua morte, visto que somente quem morre pode ressuscitar. Ela morreu porque foi plenamente humana e a morte é consequência natural da vida, independentemente do pecado. Agora, tema ainda mais difícil é o chamado debate antropológico, como, tanto no caso da Virgem como em nosso caso, explicar a ressurreição imediata, logo após a morte. Mas isto pode ficar para uma próxima ocasião. Um abraço!
Pe. Humberto Capobianco, MSC, é Diretor do Colégio John Kennedy em Pirassununga, SP.